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sábado, 1 de junho de 2013

Gilberto Gil e Jorge Ben - "Gil & Jorge / Ogum-Xangô" (1975)



Acima, a capa original de 1975,
abaixo a do relançamento em 1991
"Para mim não dá mais"
Eric Clapton,
desistindo do ritmo da jam session
que teria originado a gravação do disco



Seria de se admirar, talvez, se se dissesse para algum desavisado que apenas numa descontraída e despretensiosa jam entre dois amigos, madrugada adentro num estúdio tenha surgido um dos grandes álbuns da discografia nacional. Seria de se espantar, sim, até saber-se que estes dois personagens são nada mais nada menos que Gilberto Gil e Jorge Ben, e que encontravam-se, ambos, no auge de suas formas artísticas e criativas.
Em "Gil e Jorge - Ogum/Xangô", de 1975, trabalho frequentemente apontado por muitos como o maior disco nacional de todos os tempos, os protagonistas apenas com seus violões, acompanhados somente por dois músicos de apoio, dão um show de musicalidade, inventividade, criatividade e técnica em sessões musicais totalmente livres, alegre e espontâneas.
Canções já gravadas, como "Nêga", de Gil ganha uma energia toda nova com o violão singular e as improvisações vocais de Jorge Ben apoiando a interpretação cheia de sensualidade de Gil. "Essa é pra Tocar no Rádio", também de Gilberto Gil,tem um embalo e uma vibração contagiante, diferente da levada jazz acelerada da versão que apareceria posteriormente em "Refazenda". Das já conhecidas até então de Jorge Ben, "Morre o Burro Fica o Homem" fica mais descontraída que a original; "Quem Mandou (Pé na Estrada)", conhecida na versão de Wilson Simonal tem performance vocal destacada de Gil dando suporte à voz principal do parceiro; e "Taj Mahal", clássico de Jorge, por sua vez ganha uma versão quilométrica na qual os dois se soltam e estraçalham os itens, âmbitos, critérios e possibilidades.
"Jurubeba" é um show de improvisações e de genialidade dos dois, desde a técnica dos violões, às brincadeiras vocais de Gil, às palhaçadas do Babulina imitando um anúncio publicitário da planta.
Como é comum em grandes discos, a abertura e o final são de tirar o fôlego: "Meu Glorioso São Cristóvão" a primeira do disco é uma louvação lenta e arrastada, entoada verdadeiramente como uma oração, de maneira  emocionante por Jorge Ben; e "Filhos de Gandhi", na verdade a penúltima faixa, um longo ponto de afoxé, uma evocação aos orixás, cadenciada, imitando a levada de um berimbau, dessa vez com interpretação espetacular de Gilberto Gil, numa faixa que quanto mais vai-se desenvolvendo mais vai crescendo até se transformar num épico monumental com um final grandioso. Depois dela ainda aparece a faixa "Sarro", vinheta curta que apesar de todo o valor musical da improvisação jazzística do baixo e vocal de Gil, serve mesmo para recuperar o fôlego depois da espetacular faixa anterior e dizer adeus em grande estilo.
Sim, amigos, de uma simples sessão musical com dois violões, muitas brincadeiras, improvisações e 'alguns estímulos'..., é claro, nascia um dos maiores discos da MPB. Dizem que tudo teria se originado, noites antes, numa festa da gravadora, na qual teria estado nada mais nada menos que Eric Clapton, que impressionado com o que aqueles dois rapazes faziam ali, tocando livremente, inventando, interagindo, teria-se aventurado a tocar com as duas figuras, mas após uma longa bateria, teria 'pedido água' tal a intensidade, grau improvisação e duração da sessão dos dois brasileiros. O resultado da brincadeira teria impressionado tanto o pessoal da gravadora que estes teriam mandado Gilberto Gil e Jorge Ben imediatamente para o estúdio para reproduzir o mais fielmente possível, mas com o máximo de espontaneidade, o que protagonizaram informalmente noites antes.
Não sei se é verdade. Parece que sim.
De todo modo, independente da lenda, trata-se de um do ponto alto das carreiras de dois dos grandes artistas da música brasileira e que juntos produziram uma obra à altura de suas importâncias e expressividades. Álbum espetacular, básico, indispensável, fundamental.

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FAIXAS:
1. Meu glorioso São Cristóvão (Jorge Ben)
2. Nêga (Gilberto Gil)
3. Jurubeba (Gilberto Gil)
4. Quem mandou [Pé na estrada] (Jorge Ben)
5. Taj mahal (Jorge Ben)
6. Morre o burro, fica o homem (Jorge Ben)
7. Essa é pra tocar no rádio (Gilberto Gil)
8. Filhos de Gandhi (Gilberto Gil)
9. Sarro (Jorge Ben - Gilberto Gil)


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Ouça:
Gil e Jorge Ogum-Xangô

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Jorge Ben - "Solta o Pavão" (1975)



"Pavão Real, Pavão Dourado
Procedente da África e da Índia [...]
Sua cauda, de uma plumagem azul. verde e ouro
Formando um lindo e majestoso leque
Na Idade Média
O pavão, pela sua figura bonita e livre
Era visto como uma ave real e da sorte." 
Jorge "Sanctus" Ben,
do texto da contracapa original do disco 


Na metade dos anos 70, Jorge Ben, que ainda não tinha se tornado o Benjor que assumiria a guitarra elétrica no lugar do violão, já havia alcançado tudo que um artista popular podia. Estouro no disco de estreia, altas e baixas vendagens, idolatria e ostracismo, adesão a movimentos (sambalanço, soul, tropicalismo), participação e vitória em festivais, hits nas paradas, gravações internacionais e até briga judicial por plágio (vencida por ele sobre um Rod Stewart metido a esperto). Mas principalmente, desde que começara a carreira, o “Babulina” foi responsável pela talvez mais extensa e irreparável sequência de discos de um artista na indústria fonográfica no Brasil. Somente nos primeiros cinco anos daquela década, enfileirou os álbuns “Força Bruta”, “Negro é Lindo”, “Ben” e “10 Anos Depois”, isso sem falar dos registros ao vivo com o Trio Mocotó e dos clássicos absolutos “Gil & Jorge/Xangô Ogum” e “A Tábua de Esmeralda”. Com estes dois, principalmente o segundo, o autor de “Chove Chuva” atingia o ápice da criatividade e forjava uma linguagem totalmente peculiar, com melodias de alta inventividade, harmonias despojadas, estilo de cantar próprio e ritmo, muito ritmo. Seu samba-rock, carregado de referências ao esoterismo, à religião, à filosofia e a uma visão humanista do mundo, é igualmente sustentado na cultura popular da ginga, do país tropical, do amor, das moças bonitas e da cordialidade.

O que faltava, então, a um artista consagrado por crítica e público? Explodir. Isso que é “Solta o Pavão”: uma explosão de sonoridade, de balanço, de misticismo, de religiosidade, das paixões. Aquilo que Ben trouxera em “A Tábua...” se intensifica neste seu último disco antes da adoção de vez da guitarra, ocorrido um ano depois noutro disco emblemático, “África Brasil”. Está nele toda a bruta brasilidade de Ben, encharcada de matizes africanas e influenciada por elementos da cultura pop, do funk norte-americano ao gospel, da soul ao blues, do rock ao jazz. “Solta...”, assim, com seus riffs inspiradíssimos, sua percussão carregada e arranjos modernos, tem o despojamento e o peso de um disco de rock – sem dever nada em densidade a outros de roqueiros daquele ano, como “Fruto Proibido”, de Rita Lee, ou “Novo Aeon”, de Raul Seixas –, mas ainda com um pé no Jorge Ben do “Samba Esquema Novo”: o da batida percussiva no violão de nylon, malemolente, suingado, malandro, enraizado no morro.

A abertura dignifica todas essas qualidades: um riff de violão como um Neil Young acústico e a batida potente da percussão ao fundo. Prenúncio do arrasador samba que irá começar: “Zagueiro”, uma ode ao “anjo da guarda da defesa” no futebol. Quem sustenta a coesa cozinha, além da Admiral Jorge V Group (João “Van da Luz”, piano; Dadi “Aroul Flavi”, baixo; João “Zim” da Percussão, ritmo; e Gusta “Von” Schroeter, bateria) são os Cream Crackers, grupo formado por ninguém menos que o percussionista e arranjador Zé Roberto, o não à toa intitulado Mestre Marçal e um jovem pernambucano já muito afim com o samba chamado Bezerra da Silva. Todos comandados pela batuta de Jorge “Sanctus” Ben.

O pensamento sobre o ser humano ganhava suma importância na obra de Ben àquela época. Se o filosofia alquimista do Egito de 1.300 a.C. fora responsável pela letra de “Hermes Trismegisto Escreveu” em “A Tábua...”, agora Ben volta sua abundante musicalidade para dar cores aos densos escritos do filósofo oficial da Igreja da Idade Média: São Tomás de Aquino. Capaz de musicar até bula de remédio (e torná-la suingada!), Ben adapta trechos do complexo livro “Suma Teológica”, escrito no século XIII, e o transforma num samba cheio de molejo. Em “Assim Falou Santo Tomás de Aquino” ele consegue imprimir no hermético texto escolástico frases sonoramente cantaroláveis, como: “Senhor, que tens tido feito o nosso refúgio” ou “Estão enganados, puramente enganados/ Estão errados, puramente errados”.

O clima de devoção sambada continua na sequência numa das melhores do disco – e, por que não, da carreira de Ben. “Deus todo poderoso eterno pai da luz, da luz/ De onde provem todos bens e todos dons perfeitos/ Imploro vossa misericórdia infinita, infinita/ Deixai-me conhecer um pouco de vossa sabedoria eterna”. Esses versos dão a ideia da contrição contida na lindíssima "Velhos, Flores, Criancinhas e Cachorros", misto de prece franciscana e canto humanista. De ritmo vibrante e contagiante, passa longe de ser piegas. Pelo contrário, a música tem uma aura especial, tanto por causa da melodia quanto pelo coro alto e intenso, que traz o mesmo “Ôôô” de “Os Alquimistas Estão Chegando”, de “A Tábua...”, porém, usados em outro tom para dar uma atmosfera de canto litúrgico. Ben, como em todo o disco, está solto, tocando o violão com total desembaraço, brincando com vocalizes e melismas e inventando cantos na hora da execução.

Por falar em brincadeira, a divertida "Cuidado com o Bulldog" é, além disso, um show de musicalidade. Começa em um ritmo de rock com o band leader esmerilhando o violão e Dadi mandando ver numa base de baixo no melhor estilo Novos Baianos, ambos acompanhados por uma bateria que abusa dos rolos. Até que, de repente, um breque, e a música dá uma virada para se transformar num samba gingado daqueles de não deixar ninguém parado. A impressão é de farra, mas os músicos estão fazendo um samba-jazz do mais alto nível. Ben aproveita para se divertir com o tema, lançando grunhidos como se estivesse sendo mordido pelo cão (um desses, sampleado pela Nação Zumbi no início de “Cidadão do Mundo”, do disco “Afrociberdelia”, de 1996) e bolando frases engraçadas como: “Bulldog, mandíbulas de ouro” ou “Bulldog não perdoa, Bulldog morde”. Registro ao vivo no estúdio – assim como tudo dos álbuns dele à época –, lembra a naturalidade e a descontração das jam sessions com Gilberto Gil do então recente “Gil & Jorge”. Impagável.

"O rei chegou, viva o rei", com sua linha de metais tropicalista, segue o conceito letrístico de prosa medieva (“Então vierem os cavaleiros com seus uniformes brilhantes/ Garbosos e triunfantes/ Um abre-alas lindo de se ver/ E logo atrás/ Separado por lanceiros/ Vinha a guarda de honra, orgulhosa, polida, agressiva/ Porém bonita/ Anunciando e protegendo o rei”), estilo que serviria, entre outras semelhantes de Ben, de inspiração a Caetano Veloso para escrever “Alexandre”, do disco “Livro”, de 1997. Também prosada e tomada de suingue, "Luz Polarizada" (“Coloque o teu grisol sob a luz polarizada/ Ó meu filho/ Lava as escórias com a água tri-destilada/ Pois aquele que forja a falsa prata/ E o falso ouro/ Não merece a simpatia de ninguém”) lembra a psicodelia de “O Homem da Gravata Florida”, do disco anterior. Ben, totalmente à vontade com os companheiros no estúdio, chama-os para o “La, la, la, la, la, la” do refrão dizendo: “Quero ver o coral agora!”

Mas se tem algo que está no mesmo pé que a religiosidade e o esoterismo em “Solta...” são elas: as musas. Como um menestrel medieval apaixonado, Ben canta para várias delas: "Dumingaz", um samba “maravilha” e “sensual”, como classifica o próprio enquanto canta; “Luciana”, a “canção singela” feita pra lembrar-se do seu trovador quando se ouvir no rádio (clara homenagem a Gil por "Essa é pra Tocar no Rádio", que gravaram juntos em "Gil & Jorge" um ano antes); "Jesualda", samba-rock de riff puxado no assovio que conta a história da mulata saída da favela que ganhou a vida no exterior; e "Dorothy", outra irretocável, com destaque para o arranjo de flautas de Ugo Marotta.

“Solta...” ainda tem a gostosa "Se Segura Malandro", tema do filme homônimo de Hugo Carvana (na linha de “O Namorado da Viúva”, de “A Tábua...”) e um dos mais inspirados temas da história da música brasileira: “Jorge da Capadócia”. Um hino da MPB, regravado por Caetano, Fernanda Abreu e Racionais MC’s, que virou um símbolo do próprio autor, xará do Santo Guerreiro e filho de Ogum, o correspondente ao santo católico no Candomblé pelo sincretismo. Musicando a oração de São Jorge, Ben atinge um clímax como apenas em especiais momentos de sua carreira conseguira – talvez, parecidas, só “5 Minutos” e “Zumbi”, faixas que cumprem o fechamento dos discos “A Tábua...” e “África Brasil”. Isso porque, ao evocar as preces ao Jorge dos Céus, o Jorge da Terra o faça com tamanha potência que a música acaba ganhando uma dimensão mais profunda, etérea e espiritual. O Coral do Kojac entoa o título da canção repetidas vezes num samba marcado e intenso sob um riff de guitarra (sim, de guitarra!). Porém, a exaltação se arrefeça para, aí sim, serem declamados os emocionados versos: “Eu estou vestido com as roupas e as armas de Jorge/ Para que meus inimigos tenham pés e não me alcancem/ Para que meus inimigos tenham mãos e não me toquem/ Para que meus inimigos tenham olhos e não me vejam/ E nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal”. Ben, com sua voz oscilante, funde canto de escravos à dicção do morro. Um teclado entra para fazer a base, enquanto o violão sola e a percussão, estilo jazz-fusion, desenha um compasso arrastado e assimétrico. Para terminar, retorna a melodia da abertura, porém ainda mais enérgica, mais volumosa, mais expressiva. Um desbunde.

Guardadas as devidas proporções, “Solta...” é o “Magical Mystery Tour” de Jorge Ben: ao mesmo tempo em que é a continuidade natural de uma obra-prima revolucionária (“Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band”, no caso dos Beatles, “A Tábua...”, para o músico brasileiro), também a consolida, redimensionando-lhe as ideias e conceitos originais. Assim, tanto este quanto o da banda inglesa passam longe de serem meros “volumes 2” das obras-irmãs, haja vista que são tão únicos quanto estas e até mais ousados. “Solta...” é, sim, um feliz acontecimento da música brasileira de um momento em que Ben, figura única no panteão da MPB, está com toda vitalidade e alegria. Um artista pleno, que concebeu, na linha evolutiva de sua própria obra, o mais livre e completo trabalho. Majestoso e colorido como a cauda de um pavão.

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FAIXAS:
1. "Zagueiro" - 3:05
2. "Assim Falou Santo Tomaz de Aquino" - 3:04
3. "Velhos, Flores, Criancinhas e Cachorros" - 3:16
4. "Dorothy" - 3:58
5. "Cuidado com o Bulldog"  - 2:53
6. "Para Ouvir no Rádio (Luciana)" - 4:20
7. "O rei chegou, viva o rei" - 3:03
8. Jorge de Capadócia"  - 3:53
9. "Se Segura Malandro" - 2:53
10. "Dumingaz" - 3:30
11. "Luz Polarizada"  - 2:20
12. "Jesualda" - 4:06
todas as composições de autoria de Jorge Ben

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OUÇA O DISCO:
Jorge Ben - "Solta o Pavão"


Daniel Rodrigues

sábado, 3 de março de 2012

Neyde Zis e Tim Maia - "Neyde & Tim" - (1974)



Tudo aconteceu numa escaldante e misteriosa madrugada carioca no estúdio Somil, em Botafogo. A data é imprecisa. Ninguém sabe ao certo; só se tem uma vaga lembrança de que foi num final de semana de fevereiro de 1974. Os técnicos do som Ary e Célio, depois de uma sessão com Belchior, que gravava seu primeiro disco, organizavam as últimas coisas antes de fecharem tudo e irem embora. Mas eis que, no final da noite, imbica enviesado na frente do estúdio o famoso Fusca 71 roxo e verde de  Neyde Zis . E quem ao volante a acompanhava? Ele:  Tim Maia . Os dois, “maleixos” de uísque e sabe-se lá do que mais, já desceram cantando em dueto “Brother”, o gospel maravilhoso do mano  Jorge Ben . Com seu barítono inconfundível, ele reforçava o agudo nos versos: “Prepare one more happy way for my Lord” como se tivesse tomado pelo espírito de um cantor de igreja norte-americano. Ela, por sua vez, usava seu timbre rouco capaz de atingir agudos impressionantes, destilando uma segunda voz cheia de swing e emoção. E quando chegava na parte: “Jesus Christ is my Lord, Jesus Christ is my friend” era um verdadeiro desbunde: os dois, em uníssono. De arrepiar. Soul music na mais pura acepção.
Ary e Célio se entreolharam, ao mesmo tempo com admiração por presenciarem aquele belo dueto, mas também segurando a gargalhada por acharem engraçadíssimo ver aqueles dois abraçados cambaleando com uma garrafa que passava de mão em mão. Mas o que não previam era que, naquela noite,  Neyde Zis  e  Tim Maia  não tinham enchido o saco para ficarem com as chaves do estúdio à toa. E o que os técnicos jamais imaginariam, depois de darem as costas e “lavarem as mãos”, era que, por exemplo, aquela versão de “Brother” que ouviram entre soluços embriagados seria, horas depois, registrada numa performance perfeita, com espontaneidade e técnica, desfechando a mais obscura e inspirada jam session já documentada na MPB: o clássico álbum “Neyde & Tim”.
O disco é o ápice da carreira da “Diva Black”, “A menina mulher da pele preta”, como a apelidara  Jorge Ben , que a homenageara com a música que dá título ao primeiro álbum dela, de 1969. Depois de várias participações em trabalhos de parceiros – leia-se Cassiano, Tony Tornado, Hyldon e Bebeto, ou seja, só a nata da soul music brasileira –, ela, influenciada pela guinada pós-tropicalista do amigo  Erasmo Carlos  e do próprio Ben, grava o já muito bem comentado neste blog por Eduardo Wolff"Dó-Ré-Mi-Fa-Sol-Lá-Zis" , considerado por Oberdan a principal influência da Banda Black Rio e o melhor disco brasileiro dos anos 70. E não só ele a idolatrava. Até artistas internacionais louvavam Neyde Zis, como declarou Isaac Hayes, em entrevista de 1997 a BBC, quando perguntado qual a melhor cantora black de todos os tempos: Aretha Franklin ou Billie Holiday. Negando ser nenhuma das duas, ele respondeu com seu vozeirão de Chef: “The best black woman singer lives in Brazil. She’s called Neyde Zis.”
“Neyde & Tim” não tem comparação, e pode ser considerado um capítulo à parte na carreira tanto dela quanto na do “Síndico”. A sessão foi quase ininterrupta, tudo ao vivo, apenas uma paradinha e outra para emborcar um gole de uísque, fumar unzinho e comer um pouco de goiabada – coisa que Tim sempre carregava consigo para a sobremesa. O disco abre com uma obra-prima composta por  Gilberto Gil  no exílio em Londres: “Nêga”, que não coincidentemente fez parte do repertório de uma outra jam que jamais existiria não fosse “Neyde & Tim”: o disco “Gil & Jorge Xangô Ogum”, confessa homenagem de Gil e do Babulina à dupla. Nessa versão, mais cadenciada e romântica que a original, o vocal fica por conta de Neyde, que carrega na sensualidade. Tim, responsável por toda a cozinha, entrecorta a linha melódica soltando versos que pareciam ter sido escritos por Gil para Neyde: “The tropical nêga” ou “This nêga is my”.
Hayes: "Neyde Zis é a melhor
cantora negra de todos os tempos."
“Zismaia”, na sequência, é um funk sincopado cujo título traz controvérsias. Primeiro, o significado mais evidente: a simbiose musical que havia entre os dois. Porém há quem credite esse título a uma tentativa de Tim, já totalmente bêbado, em pronunciar a palavra “desmaia” num momento em que Neyde teve um rápido apagão (alcoólico, claro). As más línguas dizem que, acabada a garrafa de uísque, os dois passaram a entornar uma caninha que encontraram escondida na cozinha. O que, de certa forma, explica a existência de outra faixa, “Kaxassa”, uma das oito compostas com tamanha fluidez por Tim só naquela madrugada. (Essa segunda versão até que é bem verossímil considerando a situação.)
Sabe-se lá como, mas o Paulo Ricardo, o Rubens e o Serginho Trombone, que na época tocavam tanto na banda de um quanto de outro, apareceram por lá e gravaram a guitarra, o baixo e os sopros, enquanto Tim cuidava da bateria, do violão e de uma caxeta que trouxeram de um show em Niterói ocorrido horas antes. Neyde só se incumbia de emprestar sua voz. E era o que bastava. No máximo, um chocalho ou uns acordes de violão. Foi com essa formação que gravaram “Psychoblack”, um funk lisérgico de dar inveja a qualquer Parliament-Funkadelic; “Farofa”, baião eletrificado com uma bateria pesada cheio de groove; e “Retorno”, um samba-rock que captou o momento em que Tim reclamava do técnico de som que era... humm, ele mesmo. Todos – àquela altura já envoltos na fumaceira que tomava todo o estúdio –, caíram na gargalhada, e a música ficou uma das mais espontâneas do disco.
Ao todo são apenas 10 faixas de várias que a dupla tocou até as 7 da manhã do dia seguinte. Pelo menos foi isso que veio parar na mão do produtor Mariozinho Rocha, que finalizou a mixagem. Os LP’s impressos na época hoje são raridade, e valem uma fortuna no mercado alternativo. Sabe-se de colecionador no Japão que não vende seu exemplar nem por dez castelos de Osaka. Mas agora esta versão remasterizada com capricho no Abbey Road pode fazer com que mais pessoas possam dar o devido valor a uma das obras mais importantes da nossa música e, enfim, fazer justiça a uma artista infelizmente esquecida neste Brasil sem memória. Salve o “Gênio” Tim, claro, mas, acima de tudo, salve a “Musa” Neyde Zis!
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O impacto da noite de orgia musical e lisérgica foi tanto que, logo depois desta fatídica madrugada, Tim caiu em uma forte abstenção e a uma crise existencial que lhe levou a ler um tal de livro chamado “Universo em Desencanto”. O resto da história todos sabem no que deu.
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Poucos sabem, mas “Acenda o Farol”, gravada por Tim em 1978 no disco “Tim Maia Disco Club”, foi criada naquela noite. Quando os dois tiveram a delirante ideia de se dirigir ao estúdio da Somil, ambos vinham juntos de Niterói no tal fusquinha, que aprontou de furar um pneu no caminho. Tim, puto com o ocorrido, ao invés de ralhar, inventou uma música. Enquanto trocava o estepe lá fora, gritava para Neyde lá dentro do carro: “Pneu furou/ Acenda o farol/ Acenda o farol...”. A música foi gravada para “Neyde & Tim”, mas, infelizmente, perderam o único take porque puseram outra por cima (coisa de gente grogue). Tim só foi redescobrir a música anos mais tarde porque a encontrou escrita num papel amarrotado no bolso de uma calça que tinha usado apenas uma vez, ou seja, na histórica noite da gravação de “Neyde &  Tim”.
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FAIXAS:
1. Nêga (Gilberto Gil)
2. Zismaia (Neyde e Tim)
3. Ogulabuiê (tradicional: ponto de umbanda)
4. Batuque (Neyde e Tim)
5. Farofa (Tim Maia)
6. Psychoblack (Tim Maia)
7. Kaxassa (Tim Maia)
8. Som (Ari, Célio e Tim Maia)
9. Retorno (Tim Maia)
10. Brother (Jorge Ben)


quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Chico Science & Nação Zumbi - "Afrociberdelia" (1996)




"Afrociberdelia de África,
o ponto de fusão do maracatu,
da cibernética e da psicodelia.
Afrociberdelia é um comportamento,
é um estado de espírito, é uma ficção,
é a continuação de 'Da Lama Ao Casos'.
Afrociberdelia é tudo isso. Que mais?
É o nosso novo disco."
Chico Science





"Da Lama ao Caos"  de 1994 já havia sido uma sensação, algo impressionante, incrível, notável, "Afrociberdelia" (1996), seu sucessor era a lapidação perfeita da ideia do anterior.
Então com mais tranquilidade,maturidade, liberdade e autonomia a Nação Zumbi liderada por sua cabeça pensante Chico Science ia adiante nos conceitos e princípios de sua música. Balanço, funk, peso, regionalismo, tecnologia eram levados um passo adiante no novo álbum. A banda desta vez mais livre e com crédito da gravadora abusava dos samples e dos recursos de estúdio mas de uma maneira muito sóbria e inteligente, sem fazer com que seu som se tornasse meramente um monte de colagens sem personalidade. "Afrociberdelia" como o nome, em cada um de seus radicais, tenta sugerir une a africanidade musical, a cibernética, o espaço, o futuro e as sensações sonoras possíveis de mexer com a mente.
E nesse emaranhado de música, folclore, tradição e tecnologia, o computador da Nação Zumbi dá o 'Enter' e "Afrociberdelia" se inicializa com Mateus, personagem do maracatu que apresenta o disco: Uma breve vinheta de introdução que parece já vir disposta a derrubar tudo com uma guitarra ruidosa e pesada, disparada à ordem do verso "Eu vim com a Nação Zumbi/ ao seu ouvido falar" chamada "Mateus Enter" começa a dar o recado encaminhar um grande disco.
Quase sem pausa, praticamente emendada, "Cidadão do Mundo" quebra a violência sonora com um funk cadenciado, de ritmo gostoso extremamente bem produzido, cheio de variações rítmicas e alternativas sonoras.
A ótima "Etnia", numa das principais características da banda mescla peso com a brasilidade de forma brilhante, entremeada por samples espertíssimos e bem sacados.
"Macô", com participação de Gilberto Gil, uma das tradicionais crônicas urbanas da turma de Chico Science, foi na verdade, minha primeira mostra do então futuro trabalho numa apresentação no Vídeo Music Awards da MTV Brasil com a presença de Gil no palco, á deixando-me ótima impressão e expectativa desde então. Uma daquelas tradicionais crônicas urbanas e de costumes das áreas pobres de Recife que Chico Science e sua turma tornaram tão características em pouco tempo, embalada por um ritmo extremamente convidativo e com um toque valioso da musicalidade de Gilberto Gil. Uma das melhores do álbum.
Por mais qualidades que tenha a original de Jorge Mautner, "Maracatu Atômico" ganhava sua versão definitiva nas mãos da Nação Zumbi, nume releitura inteligentíssima de alta sensibilidade musical, que transformava, por exemplo, o violino de Mautner num refrão pop altamente sonoro e contagiante, isso sem falar que o título parece ter sido feito sob encomenda para uma grupo musical que funde ritmos regionais com tecnologia. A gravadora enfiou no disco e goela abaixo da banda três remixes de gosto duvidoso e que, mais do que isso, comprometiam um pouco a ideia de álbum, o formato e o conceito, mas a gravação original, a pretendida pela banda, a do disco mesmo é um primor e uma das melhores coisas que fizeram, ouso dizer até, respeitosamente, que, de tão perfeita "Maracatu Atômico" passou a ser mais de Chico Science do que de Jorge Mautner.
Outra das melhores do disco e da banda e que igualmente obteve boa resposta comercial e de execução pública é a embalada "Manguetown", composição brilhante de cabo a rabo, desde o conceito, a letra sobre os catadores de caranguejo nos mangues imundos, a base de baixo, a percussão mais requintada, a guitarra discreta mas eficiente, os samples, o refrão, tudo! Sonzaço!
A segue "Um Satélite na Cabeça" com sua guitarra repetida e agressiva; "Baião Ambiental', mesmo guardando características do ritmo que lhe dá nome, é mais um ponto de umbanda pontuado por um baixo distorcido. Genial!
Provavelmente a mais violenta do disco, em todos os sentidos, "Sangue de Bairro" é um metal impiedoso em que visceralmente Chico enumera os integrantes do grupo de Lampião e descreve de forma cinematográfica sua decapitação ("Quando degolaram minha cabeça passei mais de dois minutos vendo meu corpo tremendo")
Depois da porradaria, a vinheta "Interlude Zumbi" com sua profusão de berimbaus, tocados e sampleados encaminha um momento mais lento do disco com a agradável "Amor de Muito" e a boa "Crianças de Domingo" do ex-Fellini, Cadão Volapato, que faz menção ao belíssimo filme do mesmo nome, dirigido pelo filho de Ingmar Bergman;
"Samidarish" que seria o final do álbum segundo a banda, traz um instrumental psicodélico de tons orientais com uma guitarra viajante e no final um curto segmento onde Chico declama versos sobre uma batida tímida.
Tirando as versões de "Maracatu Atômico" que vinham depois, ali acabava um dos álbuns mais importantes da música brasileira. Uma das últimas vezes que se fez algo realmente relevante, criativo e original no Brasil. Nós brasileiros temos na maioria das vezes a tendência de subestimar o que se produz aqui e nessa síndrome de vira-lata não conseguimos enxergar muitas vezes a extensão de uma obra como esta. O que Chico Science e a Nação Zumbi faziam naquele momento era talvez o que de mais criativo e inovador houvesse na música mundial mas o ranço tupiniquim não permite que se veja e se reconheça algo assim.
Infelizmente a trajetória da banda com Chico Science que era inegavelmente o cérebro eletrônico do projeto foi abreviada com um acidente automobilístico e, com ele, a banda produziu apenas dois álbuns. Mesmo com os demais integrantes tendo continuado e tendo feito bons trabalhos depois, fica evidente que a genialidade, a visão, a ousadia de Chico fazem falta e mesmo o melhor da Nação Zumbi sem ele, não chega nem perto do que eles fizeram e de onde poderiam chegar. A vantagem, se é que se pode ver pelo lado bom, é que em pouco tempo de vida Chico Science nos proporcionou nada mais nada menos do que duas das maiores obras do rock nacional... e internacional, por que não?

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FAIXAS:
1. Mateus Enter (Chico Science & Nação Zumbi)
2. O Cidadão do Mundo (Chico Science/ Nação Zumbi/ Eduardo BID)
3. Etnia (Chico Science/ Lucio Maia)
4. Quilombo Groove (instrumental)
5. Macô (Chico Science/ Jorge du Peixe/ Eduardo BID)
6. Um Passeio no Mundo Livre (Chico Science & Nação Zumbi)
7. Samba do lado (Chico Science & Nação Zumbi)
8. Maracatu Atômico (Jorge Mautner / Nelson Jacobina)
9. O Encontro de Issac Assimov com Santos Dumond no céu (Chico Science / Jorge Du Peixe/ H.D. Mabuse)
10. Corpo de Lama (Chico Science / Jorge Du Peixe/ Lucio Maia / Dengue)
11. Sobremesa (Chico Science & Nação Zumbi / Renato L.)
12. Manguetown (Chico Science / Lucio Maia / Dengue)
13. Um satélite na cabeça (Chico Science & Nação Zumbi)
14. Baião Ambiental (instrumental)
15. Sangue de Bairro (Chico Science & Nação Zumbi)
16. Enquanto o Mundo explode (Chico Science & Nação Zumbi)
17. Interlude Zumbi (Chico Science / Gilmar Bolla 8 / Gira / Toca Ogan)
18. Criança de Domingo (Cadão Volpato / Ricardo Salvagni)
19. Amor de Muito (Chico Science & Nação Zumbi)
20. Samidarish (instrumental)
21. Maracatu Atômico (Atomic Version)
22. Maracatu Atômico(Ragga Mix Version)
23. Maracatu Atômico (Trip Hop)


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Ouça:
Chico Science & Nação Zumbi Afrociberdelia



Cly Reis

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Dossiê ÁLBUNS FUNDAMENTAIS 2017



Gilberto Gil e Jorge Ben lideram o quadro nacional
graças a seu disco conjunto de 1975
Chegou a hora da verdade! A hora dos números! É hora de atualizar a situação dos nossos discos favoritos e seus autores depois de mais um ano. Não, a nossa seção ÁLBUNS FUNDAMENTAIS não é uma disputa, um campeonato, mas é sempre divertido e interessante fazer este levantamento e expô-lo desta maneira "competitiva".
Em 2018 a discografia nacional deu uma belo salto na nossa lista abrindo uma certa distância para os ingleses que, até nosso último levantamento, disputavam palmo a palmo a vice-liderança entre os países. Para que se tenha uma ideia, dos vinte e nove álbuns fundamentais apontados este ano, treze foram brasileiros deixando todo o restante distribuído entre outros quatro países. Mas a dianteira continua, é claro, com os norte-americanos que, apesar de terem, em média, registrado números menores do que nos últimos anos, continuam numa situação muito confortável.
A propósito de liderança, entre os artistas internacionais a ponta de cima não teve alteração, uma vez que tanto Beatles quanto Stones quanto Bowie não colocaram mais nenhum disco na lista durante este ano. Mas é bom abrirem o olho porque Miles Davis, Talking Heads, The Who e Pink Floyd que se igualaram aos alemães do Kraftwerk, se aproximam ameaçadoramente da ponta. Já no quadro nacional só o que mantém Jorge Ben e Gilberto Gil à frente de Tim Maia, Chico Buarque, Titãs, Legião, Caetano e Engenheiros, é o disco que fizeram em parceria em 1975, porque tirando isso, todos estariam empatados com três álbuns cada.
Em épocas, a década de 70 continua mandando ver, seguida lá de longe pelos anos 80; em compensação o ano de 1986 é o que continua tendo maior número de indicados, com 19 obras, vendo o ano de 1976 segui-lo de perto com 16 álbuns. O que chama  a atenção é o aumento de títulos do século XXI, sendo quatro somente este ano, que também registrou o álbum fundamental mais recente até então, o ótimo "No Voo do Urubu" de Arthur Verocai, de 2016.
E 2018, ano da primeira década de existência do ClyBlog, virá repleto de publicações especiais comemorativas por esta data e outras ainda envolvendo futebol e Copa do Mundo como já aconteceu em 2014. Já demos início aos festejos com o número 400 dos ÁLBUNS FUNDAMENTAIS com o convidado especial Michel Pozzebon e vem mais por aí com outros amigos dando suas contribuições e falando de seus discos do coração.
Mas por enquanto é isso aí. Fiquem com os números de 2017 e vamos em frente:



PLACAR POR ARTISTA (GERAL)

  • The Beatles, David Bowie  e The Rolling Stones: 5 álbuns cada
  • Kraftwerk, Miles Davis, Talking Heads, The Who e Pink Floyd: 4 álbuns cada
  • Stevie Wonder, Cure, Smiths, Led Zeppelin, John Coltrane, Van Morrison, Sonic Youth e Bob Dylan: 3 álbuns cada


PLACAR POR ARTISTA (NACIONAL)

  • Jorge Ben e Gilberto Gil: 4 álbuns*
  • Caetano Veloso, Chico Buarque, Legião Urbana, Titãs, Engenheiros do Hawaii e Tim Maia; 3 álbuns cada
*contando o álbum Gil & Jorge

PLACAR POR DÉCADA

  • anos 20: 2
  • anos 30: 2
  • anos 40: -
  • anos 50: 15
  • anos 60: 71
  • anos 70: 108
  • anos 80: 97
  • anos 90: 71
  • anos 2000: 10
  • anos 2010: 10


*séc. XIX: 2
*séc. XVIII: 1

PLACAR POR ANO

  • 1986: 19 álbuns
  • 1976: 16 álbuns
  • 1985: 16 álbuns
  • 1977: 15 álbuns
  • 1967, 1991: 13 álbuns
  • 1968, 1972, 1979 e 1992: 12 álbuns cada
  • 1965, 1969, 1970, 1971, 1972 e 1987: 11 álbuns cada
  • 1980, 1989 e 1994: 10 álbuns cada


PLACAR POR NACIONALIDADE*

  • Estados Unidos: 140 obras de artistas*
  • Brasil: 107 obras
  • Inglaterra: 93 obras
  • Alemanha: 8 obras
  • Irlanda: 6 obras
  • Canadá: 4 obras
  • Escócia: 4 obras
  • México, Austrália e Islândia: 2 cada
  • Jamaica, Gales, Itália, Hungria, Suíça e França: 1 cada

*artista oriundo daquele país


C.R.

quinta-feira, 30 de junho de 2022

Gil 80 Anos - As 80 músicas preferidas pelos fãs


E ele chegou aos 80. Tomado de significados, o aniversário de Gilberto Gil está sendo uma celebração nacional. Por vários motivos: ele é a nossa arte maior, o nosso orgulho enquanto povo, a representação da nossa raça, da nossa sapiência espiritual, da nossa resistência política e cidadã. O Brasil que deu (que pode dar) certo. No Clyblog, basta fazer uma breve pesquisa pelo nome deste artista que se encontrarão diversas referências, talvez a de maior volume nestes quase 14 anos de blog.

Tanto é que nós, como se parentes ou súditos muito próximos, haja vista que sua arte perfaz nossas vidas desde crianças, aqui estamos reunidos para celebrar os 80 anos deste baiano que quis falar com Deus e conseguiu. Gentes de diferentes idades, estados, profissões, mas impregnados da mesma admiração pela vasta, vastíssima obra de Gil, um autor, assim como o mano Caetano Veloso – o próximo oitentão da turma – capaz de produzir misteriosamente com uma qualidade superior por décadas a fio praticamente sem quebras neste alto padrão artístico.

O “nós” a quem me refiro, claro, inclui-me, mas vai além disso. Somos oito seguidores da egrégora Gil das áreas do jornalismo, da arquitetura, da biblioteconomia, da arquitetura, da produção cultural e outros e, claro, da própria música. O talentoso músico paulista Mauricio Pereira, que já versou Gil n’Os Mulheres Negras, é um dos que generosamente colaboram conosco elencando suas preferidas. Como ele, tivemos a árdua tarefa de escolher cada um 10 músicas, chegando, devota e festivamente, à soma de 80, igual a suas primaveras completas no último 26 de junho.

Creio que, daqui a 2 anos, quando Chico Buarque completar esta mesma idade (o que todos esperamos), talvez haja comoção parecida. Mas somente parecida. Gil guarda particularidades junto ao coração das pessoas que somente ele é capaz de provocar. Tanto que não foi assim quando Roberto chegou ao time dos oitentões, nem com ErasmoTom Zé, FloraHermeto, Donato e nenhum outro da música brasileira que já tenha rompido a barreira das oito décadas. Além de recentemente sentar-se na cadeira da eternidade da Academia Brasileira de Letras, ratificando o que construiu ao longo de 60 anos de carreira, a própria imortalidade, este aniversário de Gil é um aniversário de todos: dos fãs, dos brasileiros, da América preta e mestiça, da África diáspora, da cultura latino-americana, da arte universal. De nós.

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Kaká Reis

produtora cultural
(Rio de Janeiro/RJ)

"Gil sempre fez parte da minha vida. Meus dois irmãos (autores desse blog), mais especificamente Daniel, sempre trouxeram suas melodias e letras para perto e realmente conquistaram meus ouvidos a ponto de 'Tropicália 2' ser, com ainda uns 7 anos de idade, meu disco favorito. Um ancestral vivo, ativo, criativo, que eu posso ver com meus olhos, ouvir com os ouvidos e sentir com a alma… assim é Gil. Um griot da sabedoria!”

1. "Super-homem, a Canção" ("Realce", 1979)
2. "Haiti" (com Caetano Veloso, "Tropicália 2", com Caetano Veloso, 1993)
3. "Domingo no Parque" ("Gilberto Gil", 1968)
4. "Abre o Olho" ("Gilbert0 Gil Ao Vivo" ou "Ao Vivo no Tuca", 1974)
5. "Refazenda" ("Refazenda", 1975)
6. "Sarará Miolo" ("Realce", 1979)
7. "Quanta" ("Quanta", 1997)
8. "Parabolicamara" ("Parabolicamará", 1992)
9. "Nos Barracos da Cidade" ("Dia Dorim Noite Neon", 1985)
10. "Drão" ("Um Banda Um", 1982)


Leocádia Costa

publicitária, produtora cultural e locutora
(Porto Alegre/RS)

"Escolher 10 canções na imensa e maravilhosa discografia de Gilberto Gil, Ave, é desesperador. Quando recebi o convite de participar dessa homenagem por ser uma fã dele e da sua expressão, precisei estabelecer algum critério para escolher 10 canções. Gostar, gosto de praticamente tudo o que ele canta, então esse não seria um critério adequado. Depois, pensei naquelas canções que me tiram do chão, me fazem vibrar em espirais que só ele produz. A missão de escolher ficou ainda mais complexa, porque algumas canções de Gil dizem o que meu coração gostaria de dizer, ou aquilo que minha cabeça pensaria, ainda coloca na minha boca a indignação ou a descoberta mais sensível dos inúmeros graus da Espiritualidade que ele percorre. Então, descartei esse critério também. Daí me dei conta que boa parte das iniciais 33 canções que eu havia escolhido se dividiam entre canções que estão eternizadas na voz do Gil e outras que eu escuto na voz dos seus intérpretes sendo praticamente deles (Cássia Eller, "Queremos Saber"; Rita Lee, "Panis et Circenses", João Donato, "Bananeira"; Dominguinhos, "Só quero um xodó"; Elis Regina, "Rebento"; e Cazuza, "Um trem pras estrelas", só para citar algumas, sendo impossível nominar as composições de Gil e Caetano que me nutrem a alma). Então, cheguei ao critério que me fez melhorar um pouco a seleção para chegar nas 10 escolhidas: destacaria somente aquelas canções que, para mim, são ouvidas na voz do compositor e que me marcaram profundamente e aí estão elas!"

1. "Lamento Sertanejo" ("Refazenda", 1975, com Dominguinhos)
2. "Sitio do Pica-Pau Amarelo" (Trilha sonora "Sítio do Pica-Pau Amarelo", 1977)
3. "Filhos de Gandhi" ("Gil & Jorge" ou "Xangô/Ogum", 1974, com Jorge Ben)
4. "Drão"
5. "Tempo Rei" ("Raça Humana", 1984)
6. "Vamos Fugir" ("Raça Humana", 1984, com Liminha)
7. "Domingo no Parque"
8. "Zumbi (A Felicidade Guerreira)" (Trilha sonora "Quilombo", 1985, com Wally Salomão)
9. "Aquele Abraço" ("Gilberto Gil", 1969)
10. "São João, Xangô Menino" ("Gilberto Gil ao vivo em Montreux", 1978, com Caetano Veloso)




Tatiana Viana

assessora de planejamento da Secretaria da Cultura de Viamão
(Viamão/RS)

"Acho que ele tem lugar garantido no coração, em algum lugar da memória afetiva de todo brasileiro, uma obra ampla, maravilhosa, que fala dos dilemas humanos, de amores e sofrimentos da vida de um modo geral, a desigualdade social, cultura. Gil é um pouco de cada um de nós e nós carregamos um pouco dele em nossas vidas."

1. "Emoriô" (por João Donato, "Lugar Comum", 1975, com Donato)
2. "Extra" ("Extra", 1983)
3. "Nos Barracos da Cidade"
4. "Tempo Rei" 
5. "Esotérico" ("Um Banda Um", 1982)
6. "Drão"
7. "Andar com Fé" ("Um Banda Um", 1982)
8. "Parabolicamará"
9. "Buda Nagô" ("Parabolicamará", 1992)
10. "Metáfora" ("Um Banda Um", 1982)




Maria Joana Lessa

jornalista
(Rio de Janeiro/RJ)

“Eu acho que Gil é um orixá vivo”.

1. "Extra"
2. "Afoxé É" ("Um Banda Um", 1982)
3. "Abre o Olho"
4. "Sarará Miolo"
5. "Refazenda"
6. "Back in Bahia" ("Expresso 2222", 1972)
7. "Domingo no Parque"
8. "Filhos de Gandhi" 
9. "Babá Alapalá" ("Refavela", 1977)
10. "São João, Xangô Menino"




Clayton Reis

arquiteto, cartunista e blogueiro
(Rio de Janeiro/RJ)

"Tarefa dificílima! Sempre me ocupei meramente em apreciar e nunca em elencar minhas preferidas. Numa obra tão linda, nunca me preocupei em saber se eu gostava mais dessa ou daquela. Enfim, aí estão as 'do momento'. Talvez depois me arrependa e pense em alguma injustiçada que não entrou. Mas por agora,  minhas 10 são  essas aí..."

1. "Drão"
2. "Febril" ("Dia Dorim Noite Neon", 1985)
3. "Domingo no Parque"
4. "Refazenda"
5. "Roque Santeiro (O Rock)" ("Dia Dorim Noite Neon", 1985)
6. "Raça Humana" ("Raça Humana", 1984)
7. "Ela" ("Refazenda", 1975)
8. "Back in Bahia"
9. "Parabolicamará"
10. "Lamento Sertanejo" 




Luciana Danielli

bibliotecária
(Niterói/RJ)

"Gil, baluarte da música brasileira e o maior ministro da cultura que o Brasil já teve! Grande artista!!!! Parabéns Gil! Feliz 80!"

1. "Marginália II" ("Gilberto Gil", 1968, com Torquato Neto)
2. "Refazenda"
3. "Tempo Rei"
4. "Aquele Abraço" 
5. "Toda Menina Baiana" ("Realce", 1979)
6. "Domingo no Parque"
7. "Expresso 2222" ("Expresso 2222", 1972)
8. "Lamento Sertanejo"
9. "Refavela" ("Refavela", 1977)
10. "Pela Internet"  ("Quanta", 1997)




Daniel Rodrigues

jornalista, escritor, radialista e blogueiro
(Porto Alegre/RS)

"'Gil engendra em Gil rouxinol', cantou Caetano usando as palavras do poeta Souzândrade para falar de Gilberto Gil. A obra de Gil é gigante em vários sentidos, por isso, misteriosa. Inclusive no assombroso volume de canções da primeira linha da música mundial. E quantas que eu adoro tiveram que ficar de fora da minha lista! 'Aqui e Agora', 'O Oco do Mundo', 'Haiti', 'Febril', 'Rock Santeiro (O Rock)', 'Beira-Mar', 'A Balada do Lado sem Luz'... Apenas 10 é pouco para representá-la e representá-lo, mas creio que, sim, muito bem representadas quando junto às 10 de todos nós. Viva Gil!! Axé!"

1. "Filhos de Gandhi"
2. "Lamento Sertanejo"
3. "Back in Bahia" 
4. "Drão" 
5. "Cores Vivas" ("A Gente Precisa Ver o Luar", 1981) 
6. "Domingo no Parque"
7. "Palco" ("A Gente Precisa Ver o Luar", 1981)
8. "Queremos Saber" (por Erasmo Carlos, "A Banda dos Contentes", 1976)
9. "Cinema Novo" ("Tropicália 2", com Caetano Veloso, 1993)
10. "Lamento de Carnaval" ("Quanta Gente Veio Ver", 1998, com Lulu Santos)




Maurício Pereira

músico e jornalista
(São Paulo/SP)

Difícil demais escolher 10 músicas do Gil pra passar pra vocês, o repertório dele tem coisas fundamentais, de cara eu já pensei numas 30… E não tou falando não como o Maurício músico ou compositor, não. Falo como ouvinte, como um brasileiro comum que se serviu da poesia, da sensibilidade, da inquietude filosófica, da visão de mundo desse artista, pra poder tentar entender e viver o mundo (e o Brasil) dum modo mais profundo e mais misterioso. Salve o Gil! .”

1. "Retiros Espirituais" ("Refazenda", 1975)
2. "Jeca Total" ("Refazenda", 1975)
3. "Vitrines" ("Gilberto Gil", 1969)
4. "Aquele Abraço"
5. "Louvação" ("Louvação", 1966)
6. "Raça Humana"
7. "Domingo no Parque"
8. "Batmacumba" (por Os Mutantes, "Tropicália" ou "Panis et Circensis", 1968, com Caetano Veloso)
9. "Meio de Campo" (por Elis Regina, "Elis", 1973)
10. "Tradição" ("Realce", 1979)



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As mais votadas

- "Domingo no Parque" - 7 votos
- "Drão" - 5 votos
-"Lamento Sertanejo", "Refazenda" e "Tempo Rei" - 4 votos
- "Back in Bahia" , "Parabolicamará", "Aquele Abraço" e "Filhos de Gandhi" - 3 votos
- "Abre o Olho", "Raça Humana", "Extra", "Sarará Miolo", "Nos Barracos da Cidade" e "São João, Xangô Menino" - 2 votos
"Super-homem, a Canção", "Haiti", "Quanta", "Sitio do Pica-Pau Amarelo", "Vamos Fugir", "Zumbi (A Felicidade Guerreira)", "Emoriô", "Esotérico", "Andar com Fé", "Buda Nagô", "Metáfora", "Afoxé É", "Babá Alapalá", "Febril", "Roque Santeiro (O Rock)", "Ela", "Marginália II", "Toda Menina Baiana", "Expresso 2222", "Pela Internet", "Cores Vivas", "Palco", "Queremos Saber", "Cinema Novo", "Retiros Espirituais", "Jeca Total", Vitrines", "Tradição", "Meio de Campo", "Batmacumba" e "Louvação" - 1 voto



Daniel Rodrigues