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quinta-feira, 10 de março de 2011

Novos Baianos - "Acabou Chorare" (1972)

Lá vem o Brasil bater à minha porta


 
Acima, a capa original de 1972,
e abaixo, a do relançamento em 1984
“Um heavy-samba que misturava
os mestres da MPB
com os sons internacionais
resultou num dos melhores discos
da história da música pop nacional.”
Nelson Motta



Era só um grupo de hippies doidões que, na utopia de viver em uma comunidade de “paz e amor”, saiu em bando da Bahia para se socar em um sítio em Vargem Grande, no Rio de Janeiro, estado onde a indústria fonográfica de fato acontecia naquele início de anos 70. Almejavam ganhar a vida tendo como inspiração seus ídolos do rock: Jimi Hendrix, Janis Joplin, Beatles, Mama’s & The Papa’s e por aí vai.
Num Brasil tricampeão de futebol e em plena ditadura de AI-5, os “heróis da resistência” e também baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso recém voltavam do exílio em Londres. Os festivais, sufocados, já não tinham a mesma efervescência político-cultural. Nas rádios, o predomínio do pop mezzo-caipira mezzo-brega mezzo-romântica (ou seja: para tentar agradar a todo mundo) da dupla Antonio Carlos & Jocafi não desagradava aos militares, e isso era o que importava. O movimento hippie, assim como qualquer outra manifestação artística e cultural, não tinha a menor voz naquele cenário (a ver a repressão ao tropicalismo). Ou seja: aquela turma estava fadada a cair no esquecimento.
Até que um dia, ainda morando na cidade, aparece na porta do apartamento da galera um senhor sério de terno e gravata. Era a “cana”? O cheiro do baseado tinha incomodado tanto assim os vizinhos? Depois de muito se amontoarem para espiar pelo olho-mágico, perceberam de quem se tratava: era simplesmente o Brasil que lhes batia à porta. Ah! O outro nome do Brasil é João Gilberto, caso não saibam. E a turma de ripongos – formada por Baby Consuelo (vocal, percussão), Paulinho Boca de Cantor (vocal, percussão), Pepeu Gomes (guitarra, violão solo, craviola, arranjos), Dadi (baixo), Jorginho (bateria, bongô, cavaquinho), Baixinho (percussão e baixo), Bolacha (bongô) e liderada por Moraes Moreira (vocal, violão base, arranjos) e Luiz Galvão (composições) – era a banda Novos Baianos.
Formado ainda em Salvador, em 1968, os Novos Baianos lançariam um ano depois seu disco de estreia, “Ferro na Boneca” que, embora o relativo sucesso comercial, não podia ser repetido para um segundo trabalho. A fórmula roqueira já não condizia com o que a mídia e nem os próprios músicos ansiavam. Eram talentosíssimos: Moraes e Galvão, criativos compositores; Pepeu, o primeiro virtuose da guitarra brasileiro; Baby, uma intérprete irreverente e moderna; Dadi, um baixista de mão cheia. Mas sentiam que precisavam de sangue novo.
Foi então que, naquela aparição divina, o “velho baiano” trouxe-lhes o dendê que faltava na receita. A bossa nova, que o João Gilberto ajudara a cunhar em 1958 com Tom Jobim e Vinícius de Moraes, além de modernizar o samba, diminuindo seu compasso e adicionando toques do cool jazz americano, tinha impregnada na sua estrutura melódica e harmônica toda a tradição do samba, do maxixe aos standards da Rádio Nacional. Quer dizer: o exemplo da bossa de João Gilberto vai além da música: é o reconhecimento de um Brasil etiologicamente desenvolvido enquanto força artística. E os Novos Baianos captaram isso. Com o talento e experiência que tinham, em 1972, eles entraram no estúdio da Som Livre sob o comando de Eustáquio Sena para criar o disco que hoje é um dos mais importantes da música popular brasileira: “Acabou Chorare”.
A veia brasileira já diz a que veio de cara, abrindo o disco com “Brasil Pandeiro” numa versão histórica do samba de Assis Valente (composição de 1940, imortalizada na voz de Carmen Miranda) incluída no repertório por indicação de João Gilberto. Ali já estava tudo pelo o que a banda passou a ser reconhecida a partir de então: a fusão incrivelmente harmoniosa e orgânica do regional e do universal, onde tudo é samba ao mesmo tempo em que é rock, que é baião, que é frevo, que é pop. E com rebeldia, bom humor e pegada!



Em seguida, talvez grande obra-prima dos Novos Baianos enquanto conjunto: “Preta Pretinha”. Uma balada de mais de seis minutos que inicia apenas com voz e violões brejeiros, e que vem num crescendo aonde os outros elementos da banda vão sendo adicionados aos poucos até um final emocionante em que todos brilham. Aliás, esta é uma das características do disco: ser extremamente bem executado, a ver a bela instrumental "Um Bilhete Pra Didi", de pura técnica e inúmeras referências melódicas que vão de Hendrix a Jacob do Bandolim.
Há "Mistério do Planeta", "A Menina Dança" e “Tinindo Trincando”, canções pop com levada de MPB e um trabalho de guitarra excepcional de Pepeu Gomes. Mas é mesmo a raiz afro-brasileira que dá o tom: em "Swing de Campo Grande" (“Minha carne é de carnaval/ Meu coração é igual”) e “Besta é Tu” a galera chama no pé! Esta última, claramente surgida de um momento de discussão que acabou dando samba.
A ligação com as raízes do Brasil, que João Gilberto tão bem traduziu na bossa nova na sua inaugural batida de violão e seu modo econômico mas completo de cantar, entraram na música dos Novos Baianos de forma consistente e definitiva. Mas não com exageros. E esta releitura inteligente do moderno e do antigo fez com que “Acabou Chorare” se alinhasse ao tropicalismo, tão carente de um novo gás naquele instante. “Nós vimos o tropicalismo de Gil e Caetano e acreditamos que era possível criar algo novo”, disse Galvão certa vez.
O fato é que esta obra abriu portas para que bandas como Paralamas do Sucesso, Pato Fu, Rappa e Skank tenham hoje terreno para misturar o pop que vem de fora com ritmos brasileiros sem que se lhes torçam a cara por isso. Com justiça, “Acabou Chorare” é considerado discoteca básica essencial, tanto que consta como primeiríssimo da lista dos 100 discos fundamentais da música brasileira pela revista Rolling Stone.
Mas falta falar ainda da verdadeira pérola do disco: a faixa-título. Se em “Preta Pretinha” o talento de todos é chamado em cena, na faixa “Acabou Chorare” são apenas os violões de Moraes e Pepeu que brilham. E isso basta. Bossa nova total, esta delicada canção de ninar, além da linda melodia (e o rico solo de Pepeu ao final), traz na letra uma novidade na música brasileira enquanto estilo. Antes mesmo de grandes obras musicais para crianças como “A Arca de Noé” de Vinícius ou “Os Saltimbancos” de Chico Buarque, ela versa palavras do imaginário lúdico infantil com uma pureza e inocência que suscitam imagens incomuns e até surreais. Neologismos, palavras que se encadeiam pela sonoridade, frases “sem sentido”. Afinal, quem não há de se emocionar com os singelos versos que dizem que a abelhinha “Faz zunzum e mel”, ou que ela “Tomou meu coração e sentou/ Na minha mão”?
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“Acabou Chorare” têm como “musa” a filha de João Gilberto, a hoje internacionalmente conhecida Bebel Gilberto, com 6 anos na época. A coisa toda surgiu do convívio dos dois com a banda. O título, algo como “parou o choro”, era dito por Bebel e vem da confusão que ela fazia entre os idiomas português, espanhol e inglês por conta dos períodos de residência no México e EUA, além do Brasil.
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Foi João Gilberto também quem, um dia, sentado na rua ao lado de Moraes e Galvão, ao ver uma linda mulata passar caminhando com “seus requebros e maneiras”, disse aos dois a frase que inspirou a música Moraes, gravada em 1979: “olha lá, gente: lá vem o Brasil descendo a ladeira!”
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FAIXAS:
1. "Brasil Pandeiro" (Assis Valente)
2. "Preta Pretinha" (Luiz Galvão / Moraes Moreira)
3. "Tinindo Trincando" (L. Galvão / M. Moreira)
4. "Swing de Campo Grande" (Paulinho Boca de Cantor / L. Galvão / M. Moreira)
5. "Acabou Chorare" (L. Galvão / M. Moreira)
6. "Mistério do Planeta" (L. Galvão / M. Moreira)
7. "A Menina Dança" (L. Galvão / M. Moreira)
8. "Besta é Tu" (L. Galvão / Pepeu Gomes / M. Moreira)
9. "Um Bilhete Pra Didi" (Jorginho Gomes)
10. "Preta Pretinha (reprise)" (L. Galvão / M. Moreira)

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Ouça:
Novos Baianos Acabou Chorare




por Daniel Rodrigues

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Novos Baianos - "Novos Baianos F.C." (1973)





“Eles se achavam na época
melhores jogadores de futebol
do que músicos.” 
Solano Ribeiro



Quem me conhece sabe que a minha banda brasileira favorita veio da Bahia não é o Camisa de Vênus. Claro que são os Novos Baianos. E toda vez que alguém fala neles, pensa direto em "Acabou Chorare", um verdadeiro... clássico da MPB de todos os tempos. Adoro este disco. Mas o meu favorito deles é outro: “Novos Baianos F.C.”, terceiro disco da trupe, lançado um ano depois do “Acabou...”. Pensem bem: depois de fazer um disco como aquele, como seguir em frente? Pois Pepeu, Baby, Paulinho e Moraes e sua gangue resolveram fazer um LP falando das coisas que faziam parte da sua vida cotidiana naquele sítio em Jacarepaguá onde viviam em total harmonia (mais ou menos, né? como ficou claro no filme "Filhos de João - O Admirável Mundo Novo Baiano", de Henrique Dantas).

A brincadeira começa com “Sorrir e Cantar Como Bahia”, música de Luiz Galvão e Moraes Moreira que faz um jogo de palavras com a gravidez de Baby Consuelo e a maternidade do planeta: “Mãe pode ser e ter bebê/ E até pode ser Baby também”. Ela estava permanentemente grávida de Riroca, Zabelê e Nana Shara, suas três meninas que se tornariam o trio SNZ. O futebol do título está presente em “Só Se Não For Brasileiro Nessa Hora”. Como cronista do cotidiano, Galvão consegue mostrar exatamente o que acontecia nas ruas do Brasil, até bem pouco tempo, o joguinho de bola na calçada: “Que a vida que há do menino atrás da bola/ para carro, para tudo/ quando já não há tempo/ para apito, para grito/ E o menino deixa a vida pela bola/ Só se não for brasileiro nessa hora”. O lado nonsense de Galvão, o letrista da banda, aparece em “Cosmos e Damião”, uma verdadeira viagem onomatopaica na voz de Paulinho Boca de Cantor. Olhem que maluquice: “Qui qui qui qui qui não é qui qui qui/ Que bom é bom demais pra ser aqui/ Onde um faz hum e outro hum hum/ Mas que bom, todos hum!/ Como um dia, não ria ?/ Sorria como nós...um dia como esse de Cosmos e Damião/ você pode até dançar com Damião/ Mas quem contrariar a lei do Cosmos/ não vai pagar/ já paga ao contrariar”. Doideira total emoldurada pelas guitarras, bandolins e violões de Pepeu e Moraes, o baixo de Dadi, Jorginho Gomes na bateria mais Paulinho, Baby, Baixinho e Bola nas percussões. Eles fazem a gente cantar estes versos enlouquecidos.

Uma das influências mais marcantes do grupo,  Dorival Caymmi, é reinterpretado e rearranjado em “O Samba da Minha Terra”. Uma mistura de MPB com Jimmi Hendrix, a versão deles valoriza o verso: “Quem não gosta de samba/ Bom sujeito não é/ É ruim da cabeça ou doente do pé”. Esse sim é o verdadeiro roque brasileiro, onde as guitarras convivem harmonicamente com a percussão e não copiam ninguém. Ao ouvir os discos dos Novos Baianos – e esse, em particular –, fico imaginando porque grande parte da gurizada se deixa seduzir pelo “rock brasileiro” dos anos 80. Todas as bandas daquela fase são inspiradas em algum grupo inglês do período. Poderia também dizer copiadas. Enquanto isso, os NB usaram a incrível e inesgotável matriz de ritmos nativos para fazer uma música criativa e inteligente. “Vagabundo não é Fácil” é outro exemplo das letras maluquetes de Galvão numa cama de samba com um surdo bem marcado: “Se eu não tivesse com afta/ até faria uma serenata pra ela/ Que veio cair de morar/ Em cima de minha janela”. Lá pelas tantas, rola uma rima de “Bicarbonato de sódi”o com “pessoas sem ódio”. Hilário! E no final, mais um jogo de palavras: “Ao menos leve uma certeza/ Você me deixa doído/ Mas só não me deixará doido/ Porque isso sou/ Isso eu já sou”. Na sequência, outro sambão daqueles de sair cantando pela rua: “Com Qualquer Dois Mil Réis”. Na voz de Paulinho Boca de Cantor, a música brinca com a figura do malandro carioca: ”E o malandro aqui/ Com Qualquer Dois Mil Réis/ Põe em cima uma sandália de responsa e essa camisa/ de malandro brasileiro/ que me quebra o maior galho”. E o refrão é chicletaço musical: “E esse ano não vai ser/ Igual aquele que passou/ oh oh oh oh oh que passou”.

Depois deste samba balançado, vem a faixa mais “roquenrou” de todo o disco, “Os Pingo da Chuva”, que Baby Consuelo se encarrega de dar aquele molho. Preste a atenção nos comentários da guitarra de Pepeu durante toda a canção, enquanto Baby canta este história pro seu namorado – não por acaso, ele, Pepeu, na época –, dizendo que ele não deve se preocupar com o céu que está “preto e as nuvens que até as sombras assombram”. Ela sabe que “Você tem seus argumentos de querer/ o sol pra bater sua bola/ E a lua pra ver sua mina/ ou só pra ir ali na esquina...Faça como eu que vou como estou/ porque só o que pode acontecer/ É os pingo da chuva me molhar”. E esse rock vira um baião elétrico no final. É aí que eu me refiro. Com tantas possibilidades rítmicas e melódicas, os roqueiros dos anos 80 se contentavam em copiar The SmithsThe Cure, The Police, entre outros. Que desperdício! “Quando Você Chegar” é uma bossa a lá João Gilberto onde Moraes fala de um filho que está chegando e que, aparentemente, iria chamar de Pedro. Os planos devem ter mudado, pois este filho é o guitarrista Davi Moraes, que veio a Porto Alegre em 2013 com ele para um show em homenagem aos 40 anos de “Acabou...”. Lá pelas tantas, esta bossa vira um samba. E a letra é tão boa que vai inteira: “Quando você chegar/ é mesmo que eu estar vendo você/ Sempre brincando de velho/ me chamando de Pedro/ me querendo menino que viu de relance/ Talvez um sorriso em homenagem à Pedro/ Pedro do mundo dum bom dum bom dum bom.../ Fique quieto que tudo sana/ Que a língua portuguesa, a língua da luz/ A lusitana fez de você o primeiro guri/ Meu guri, meu gurizinho/ Água mole em pedra dura, pedra pedra até que Pedro”.

Pra encerrar “Novos Baianos F.C”, duas faixas sem letra. Desde "Acabou Chorare" existia, dentro dos Novos Baianos, o grupo instrumental A Cor do Som, formado por Pepeu, Dadi, Jorginho e os percussionistas. As duas últimas músicas são dedicadas a este embrião de trabalho que iria desembocar no grupo de mesmo nome que gravaria seu primeiro disco em 1977. Na formação de estreia, só Dadi permaneceria, tendo ao seu lado o irmão Mu mais Armandinho e Gustavo. “Alimente” e “Dagmar” são dois exemplos do que seria desenvolvido pela Cor e por Pepeu em seu primeiro trabalho solo, “Geração de Som”, em 1978. Choro, samba, rock, tudo misturado e embalado pra presente. Uma delícia de disco que muita gente não conhece. Em 1978, os Novos Baianos gravam seu último disco, “Farol da Barra”, outro trabalho incrível. E decolam as carreiras solo de Pepeu, Baby, Dadi na Cor do Som. Mas isso, como sempre, é outra história.


vídeo de "Só Se Não For Brasileiro Nessa Hora" - Novos Baianos


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FAIXAS:
1. "Sorrir e cantar como Bahia" (Luiz Galvão/Moraes Moreira) – 3:37
2. "Só se não for Brasileiro Nessa Hora" (Galvão/Moraes) – 3:28
3. "Cosmos e Damião" (Galvão/Moraes) – 4:07
4. "O Samba da minha Terra" (Dorival Caymmi) – 3:29
5. "Vagabundo não é Fácil" (Galvão/Moraes) – 5:06
6. "Com qualquer Dois Mil Réis" (Galvão/Moraes/Pepeu Gomes) – 3:26
7. "Os Pingo da Chuva" (Galvão/Moraes/Pepeu) – 4:10
8. "Quando você Chegar" (Galvão/Moraes) – 3:19
9. "Alimente" (Jorginho Gomes/ Paulinho Gomes) – 4:44
10. "Dagmar" (Moraes) – 2:31

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OUÇA:



terça-feira, 9 de agosto de 2011

“Filhos de João - O admirável mundo novo baiano”, de Henrique Dantas (2011)




Assisti neste fim de semana a “Filhos de João - O admirável mundo novo baiano", de Henrique Dantas, um divertido documentário sobre os Novos Baianos, a grande banda de MPB dos anos 70. Revolucionários, os Novos Baianos – leia-se Moraes Moreira, Pepeu Gomes, Dadi, Paulinho Boca de Cantor e toda uma enorme trupe que formava a banda – foi responsável pela manutenção do movimento tropicalista no Brasil pós-AI5 e pela revalorização dos elementos tradicionais da música brasileira, mesclando-os com muita propriedade e qualidade ao rock de Hendrix , Stones , Beatles , Janis e outros.
Para mim, adorador de música brasileira e da banda, ver um filme como este é um deleite. E fiquei extremamente feliz quando percebi já no título uma afinidade de pensamento, uma vez que há alguns meses escrevi para este blog uma resenha sobre o melhor disco dos Novos Baianos, “Acabou Chorare”, de 1971. Intitulada "Lá Vem o Brasil Bater à Minha Porta" , abordei justamente a relação da banda com o “velho baiano” João Gilberto e o episódio em que ele, numa aparição tão inesperada quanto mágica no apartamento dos músicos no Rio, levou àquele grupo de hippies “os requebros e maneiras” do samba, ensinando-lhes a batida de violão da bossa nova e abrindo a cabeça da galera para os ritmos brasileiros, tornando-se pai espiritual da galera. Impressionou tanto que Moraes, por exemplo, chegou a cogitar de não tocar nunca mais depois daquilo! A narrativa do filme, bem estruturada, ressalta com assertividade este ponto, mostrando como os Novos Baianos passaram a introduzir o toque afro-brasileiro no seu estilo por indicação de João, mudando para sempre o modo de fazer rock e de fazer música popular no Brasil e no mundo.
Há revelações interessantes, como a de que o nome artístico Baby Consuelo foi atribuído a então Bernadete Dinorah inspirado no de uma personagem prostituta do filme “udigrudi” brasileiro “Caveira My Friend” (de Álvaro Guimarães, 1970). Também, a ideia da música “Acabou Chorare” – primeira bossa nova composta por aqueles jovens roqueiros e talvez a composição mais linda do grupo –, que surgiu das histórias que João Gilberto contava sobre sua pequena filhinha, a hoje cantora mundialmente conhecida Bebel Gilberto. E se quem escuta a música já se emociona (eu, em pleno cinema, me peguei às lágrimas), imagina o sentimento do autor! E foi isso que Moraes confessou: de tão impactado pela beleza e emoção de ter feito aquela canção, passou quatro dias sem dormir, tocando repetidas vezes a obra-prima que acabara de criar.

Baby, Galvão, Moraes e Paulinho,
o núvleo da banda
Ponto negativo é a não-participação de Baby. Corrigindo: é Baby do Brasil, hoje evangélica, quem não participa, pois se negou a gravar entrevistas. Mas a Baby Consuelo, ah, essa estava lá! Magrinha e extrovertida, ela aparece em filmes da época como no documentário para a TV alemã, realizado na metade dos anos 70, em que canta, radiante, “A Menina Dança”. Uma doçura. João Gilberto é outro que não aparece – a não ser numa imagem fotográfica. Mas é citado por quase todos os entrevistados: Dadi, Tom Zé, Rogério Duarte, Moraes, Galvão, Pepeu e outros. Sua figura é tão essencial na história dos Novos Baianos que sua aparição é até dispensável. Mais do que isso: a não-aparição de João, se não proposital, acaba adensando ainda mais a aura mística que ele tem para com todos da MPB moderna, e o filme capta super bem essa reverência.
“Filhos de João” é mais um bom registro documental tal como vem se fazendo no Brasil nos últimos 10 anos, período em que o cinema nacional avançou muito neste formato, resgatando momentos e personagens importantes como a Velha Guarda da Portela, Dzi-Croquettes, Paulinho da Viola, Oscar Niemeyer, jornal Sol, Wilson Simonal e vários outros. Agora, é a vez de saudar os Novos Baianos, no “passado, presente, particípio”, como diz naquela letra.


quarta-feira, 16 de maio de 2018

Música da Cabeça - Programa #58


A abolição da escravatura completou esta semana 130 não sem sofrimento e luta ao longo deste tempo. Claro, não poderíamos deixar passar (nem em branco e muito menos em preto!) essa data, que falaremos no nosso Música da Cabeça de hoje. Isso e muita música, evidentemente, entre elas coisas de The Clash, Emicida, Pepeu Gomes e Nação Zumbi. Ainda, “Palavra, Lê”, “Música de Fato” e um "Sete-List" homenageando os 7.0 de Brian Eno. Tudo isso no programa desta noite. É às 21h, pela Rádio Elétrica, com produção e apresentação de Daniel Rodrigues. Por que negra é a raiz da liberdade.


Rádio Elétrica:

quarta-feira, 5 de maio de 2021

Música da Cabeça - Programa #213

 

Vamos também entrar na onda: "MDC from Rio"! Sobem no nosso ônibus hoje João Gilberto, Beck, Hubert Laws, Ray Charles e Amado Maita. Também damos uma carona para Pepeu Gomes no 'Música de Fato' e para o sessentão Herbert Vianna no 'Palavra, Lê'. Pode entrar, que seu banco tá reservado no mercedão da Rádio Elétrica, que parte às 21h. Produção, apresentação e passe livre: Daniel Rodrigues.


Rádio Elétrica:
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